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Atletas

A grandeza de Anderson Silva | Hall da Fama do UFC

Confira uma reflexão sobre Anderson Silva, o novo Hall da Fama do UFC, que dominou o Octógono por quase uma década para conquistar o merecido lugar entre os melhores

Algumas pessoas que conheceram o UFC durante a pandemia ou quando Conor McGregor apareceu nos holofotes pode ter uma visão turva sobre Anderson Silva, novo membro do Hall da Fama do UFC.

Isso talvez tenha como causa as suas últimas apresentações na carreira - uma vitória solitária em suas últimas nove lutas; duas derrotas por nocaute ou duas lutas que terminaram por lesão, além de um duelo sem resultado contra Nick Diaz no UFC 168, que ficou muito mais lembrado pelas provocações do norte-americano do que a ação entre os lutadores.

Porém, para aqueles que acompanharam o esporte antes disso - que assistiram ele chegar na categoria dos médios como uma força sísmica, conquistando o cinturão em sua segunda luta no UFC antes de ter como legado um dos maiores reinados na história do esporte - os últimos anos da carreira de Anderson jamais apagarão os momentos, lutas e memórias que o brasileiro deu aos fãs, o consolidando como uma das figuras mais icônicas na história do UFC.

Anderson Silva comemora sua vitória contra Vitor Belfort no UFC 126. (Foto por Jed Jacobsohn/Zuffa LLC)

Anderson Silva comemora sua vitória contra Vitor Belfort no UFC 126. (Foto por Jed Jacobsohn/Zuffa LLC)


Anderson Silva venceu Chris Leben em 49 segundos em sua estreia, parando o rival com uma joelhada no clinch. Menos de quatro meses depois, ele nocauteou Rich Franklin em apenas três minutos para conquistar o cinturão peso-médio.

Travis Lutter chegou ao 2° round antes de ser derrotado. Nate Marquardt não passou do 1°. E Franklin foi mais uma vez superado por uma verdadeira tempestade de joelhadas, dando a Anderson três vitórias em 2007 e um cartel de 5-0 no UFC.

Ele começou 2008 finalizando o ex-campeão do PRIDE Dan Henderson, então subiu de categoria e atropelou James Irvin em 61 segundos ao segurar um chute e acertar um potente golpe de direita, mostrando que Anderson poderia permanecer no peso meio-pesado caso ele tivesse essa vontade.

Sua luta contra Patrick Coté no UFC 90 terminou com o desafiante sofrendeu uma lesão no joelho, e sua luta com o compatriota Thales Leites foi para a decisão dos juízes em Montreal. A cada luta, Anderson parecia mais desligado e menos explosivo, o que fizeram muitos indagarem se ele estava deixando seu auge ou se apenas estava entediado com os desafios no Octógono.

Mas as perguntas foram respondidas de forma enfática em 8 de agosto de 2009, na Filadélfia, quando Anderson roubou a cena no UFC 101 com uma das performances mais espetaculares já vistas contra o ex-campeão meio-pesado Forrest Griffin.

Depois de estudar Griffin pelos dois primeiros minutos, o brasileiro balançou o rival com um gancho de direita antes de começar a provocá-lo no centro do Octógono. Ele então baixou suas mãos e ficou na frente do norte-americano, totalmente despreocupado com o que potencialmente poderia vir em sua direção.

Pelos próximos 60 segundos, o campeão dos médios parecia estar como Neo, do filme Matrix, desviando das balas. Ele esquivou de todos os socos que Griffin desferia e enquanto recuava, acertou o rosto do ex-campeão com um golpe. A diferença de velocidade era evidente e os dois pareciam estar em níveis completamente diferentes.


Quando Griffin tomou a decisão de voltar a pressionar, Anderson o colocou no chão com um jab preciso. O norte-americano então levantou suas mãos em desistência e o que era esperado para ser um duelo equilibrado mais pareceu uma sessão de sparring unilateral. O talento superior do "Spider" era evidente.

De lá, ele venceu Demian Maia por decisão unânime em Abu Dhabi, no UFC 112, onde Anderson não pareceu se empenhar muito. Pouco tempo depois, um desafiante chamado Chael Sonnen apareceu em cena com provocações e o famoso trash talk contra Anderson, seus companheiros de equipe e contra o Brasil, prometendo que iria tirar o cinturão do campeão.

Por 23 minutos, no UFC 117, Sonnen estava fazendo jus a tudo o que tinha dito, impondo seu ritmo contra o brasileiro de forma incansável, colocando Anderson no chão e dominando completamente a luta por cima no solo. Sua coroação como o novo campeão peso-médio parecia inevitável.

Mas estamos falando de Anderson Silva.

Antes do fim do último round, Sonnen cometeu o erro de deixar Anderson armar um triângulo por baixo. O brasileiro arqueou suas costas e fez uma transição para uma chave de braço. Sonnen resistiu o máximo que pode, mas bateu em desistência. Logo em seguida, argumentou que não fez o gesto, mas o registro não nega o ato.

Pela segunda vez em 364 dias, o brasileiro brilhou no Octógono, mostrando que a luta contra Demian foi mais um exemplo em que ele não estava totalmente comprometido, levando o combate completamente a sério.

E se a luta contra Sonnen mostrou que ele era o verdadeiro campeão, sua luta e vitória contra Vitor Belfort o elevaram ao status de lenda.

Anderson era o campeão, mas Belfort era a verdadeira estrela - ao menos no Brasil.

Quando Belfort surgiu em cena no final dos anos 90, o "Fenômeno" era uma jovem e explosiva promessa; uma estrela em ascensão que nocauteou Wanderlei Silva no Octógono. Sua vida pessoal e todo o carisma, além de aparições em programas de TV, fizeram com que Belfort se tornasse uma grande estrela.


Tudo que envolvia Anderson e Belfort era tenso, incluindo a última encarada, onde Silva usou uma máscara toda branca assim que ambos ficaram com as testas coladas. O campeão levantou a máscara e novamente ficou próximo do rosto de Belfort, e os dois lutadores passaram a se provocar até que Dana White precisou intervir para que ambos não trocassem golpes ali mesmo.

Os primeiros três minutos foram de puro estudo - dois lutadores perigosos circulando no Octógono, trocando chutes nas pernas ocasionais, com Belfort indo para frente em um momento e acertando um golpe de esquerda antes de pegar uma tentativa de chute alto de Anderson e o levar para o chão. O campeão, no entanto, voltou a ficar em pé imediatamente.

Quando voltaram a ficar próximos, Anderson mostrou os movimentos defensivos que definiram sua luta contra Griffin, evitando todos os golpes de Belfort antes de dar o golpe final - um chute frontal que entrou direto no queixo de seu adversário.

"Ele o acertou com um chute frontal no rosto!", gritou Joe Rogan na transmissão, enquanto Anderson terminava o combate e conquistava mais uma grande vitória.

Mais tarde naquele mesmo ano, o UFC voltou ao Rio de Janeiro e Anderson foi recebido como herói, liderando o evento e defendendo o cinturão contra Yushin Okami. Anderson passou a ser visto nos olhos dos fãs não apenas como o melhor lutador de MMA do mundo, mas como uma verdadeira estrela inquestionável.

Um ano depois, ele voltou a enfrentar Sonnen no Octógono. Apesar do 1° round ter sido um replay da luta anterior, com Sonnen dominando no wrestling, Anderson deu números finais no 2° round com uma joelhada no peito de Sonnen enquanto ele estava sentado na grade.

Três meses depois, ele volta ao Brasil na categoria de cima, enfrentando o veterano Stephan Bonnar de última hora e, mais uma vez, mostrando a definição que era sua carreira até então: dominante, com ninguém ameaçando seu lugar no topo da cadeia do MMA.

O nocaute contra Bonnar, em 13 de outubro de 2012, seria seu último. A última vitória em um recorde de 16 triunfos consecutivos no UFC. Um recorde absoluto.

Nove meses depois, ele iria enfrentar a invicta estrela em ascensão Chris Weidman. Anderson não levou seu rival muito a sério e pagou caro por isso, perdendo seu título, sua sequência de vitórias e a aura de invencibilidade que tinha por conta de uma performance descuidada. Eles voltaram a se enfrentar e a segunda luta terminou dois segundos antes da primeira, quando Anderson quebrou a perna após Weidman defender um chute baixo.

Ele eventualmente voltou a lutar, mas nunca mais foi o mesmo.

Anderson Silva comemora a vitória no UFC 183. (Foto por Josh Hedges/Zuffa LLC)

Anderson Silva comemora a vitória no UFC 183. (Foto por Josh Hedges/Zuffa LLC)


A performance de Anderson contra Griffin foi uma das mais impressionantes que eu já vi um lutador ter no Octógono. Foi algo completamente encantador na época e parece que as pessoas se esqueceram de tudo o que o brasileiro fez na luta - seus golpes, esquivas e tudo mais - antes de levar o rival para o chão com um jab.

Griffin entrou no Octógono como um dos principais lutadores do peso meio-pesado e um dos caras mais perigosos do esporte - e Anderson o fez parecer um verdadeiro amador.

Sua vitória contra Sonnen ainda é a maior virada de todos os tempos.

Eu me lembro de estar no Applebee's completamente pasmo em ver como o maior lutador de todos os tempos estava sendo dominado por Sonnen. Um cara que era bom lutador, mas era mais conhecido por suas provocações do que feitos em si no Octógono.

Brasil

E então, do nada, Anderson coloca suas pernas no pescoço de Sonnen, travando seu ombro e braço e fazendo com que seu rosto instantâneamente mudasse de cor.

Quando ele bateu - e não se engane quanto a isso já que Sonnen bateu em desistência de forma clara - o lugar explodiu.

Seguindo isso, nocautear Belfort com um chute frontal inesperado chega a ser até desrespeitoso, mas totalmente compreensível por sabermos o quão bom Anderson era. Nada que fosse uma verdadeira surpresa.

Sim, tivemos momentos frustrantes com ele e isso também marcou sua carreira por um certo período, mas da época em que ele estreou até sua vitória contra Bonnar no Rio, ele venceu 16 vezes seguidas, sendo 14 pela via rápida, e defendeu o cinturão dos médios 10 vezes.

Brasil

Assistir Anderson lutar no Octógono era como assistir alguém do porte de Picasso pintar, pois é exatamente isso que Anderson era: um artista incontestável, mas em um tipo de tela diferente. Ele tirava sua respiração e era inspirador.

Por essa razão que dividir o Octógono com o brasileiro era uma honra e uma experiência transformadora. Lutadores como Michael Bisping, Daniel Cormier, Israel Adesanya e Uriah Hall sabem disso. Sabem da sensação de vencer um ídolo como Anderson, especialmente para o nigeriano e o jamaicano, que tinham no "Spider" uma inspiração direta para seu modo de lutar.

Anderson Silva foi o melhor lutador do planeta por sete anos e permanece como um dos maiores de todos os tempo - e nada pode mudar esse fato.