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Atletas

Bactéria que Cigano teve e o tirou do UFC Moscou pode amputar e até matar

E todo mundo que frequenta uma academia corre risco. Segundo o infectologista Alexandre Naime Barbosa, higienização constante é a solução

Há quase um mês, quase na reta final de sua preparação para a luta principal do UFC Moscou, o lutador Junior Cigano percebeu que, depois de dar chutes em um saco de pancada, havia feito um machucado em sua perna.

Ele parecia inofensivo. Cigano tratou com gelo e anti-inflamatório. Mas, três dias depois, o ferimento não havia melhorado. Pelo contrário: estava mais aberto e com vermelhidão. O atleta também sentia a pele quente ao redor do machucado. Resolveu procurar um médico.

Resultado: Cigano entrou no hospital e não saiu mais de lá por mais de uma semana. O ferimento estava infectado com colônias de duas bactérias – uma delas, o estafilococo, pode ter graves consequências e levar à morte.

Os estafilococos são um tipo de bactéria que habita a pele de 20% das pessoas e o nariz de 30% sem causar nada. O problema acontece quando ela entra no nosso organismo. “Uma lesão insignificante depois de uma pancada, depois de um trauma, geralmente causa uma quebra da barreira de proteção que a pele oferece”, afirma o infectologista Alexandre Naime Barbosa, que é membro da Sociedade Brasileira de Infectologia.

“As próprias bactérias que fazem parte da flora da nossa pele podem ser introduzidas para a derme, para o tecido celular subcutâneo, causando o que chamamos de celulite, que é o que o Cigano teve”, diz o médico – não confunda essa celulite com aquela tratada pela medicina estética, que nada mais é que depósitos de gordura sob a pele.

A espécie mais frequente dos estafilococos é a staphylococcus aureus, justamente a que foi encontrada no atleta. “A infecção causada por essa bactéria vai levando a uma destruição do tecido local, podendo chegar além da pele e do tecido celular subcutâneo e alcançar tendões, músculos até o osso, causando osteomielite”, diz o médico.

Dependendo da imunidade da pessoa e da demora ao procurar tratamento, o negócio pode complicar muito – há casos em que a bactéria chegou ao osso em que é necessária a amputação de membros, por exemplo.

“Se a bactéria cai no sangue, pode ir para qualquer lugar do organismo. Se chegar no coração, é possível que cause endocardite; no pulmão, causa pneumonias graves; no cérebro, leva à meningite. Além disso, a pessoa pode morrer de sepse, que é a infecção generalizada”, o especialista explica.

Quando a staphylococcus aureus leva à septicemia ela ganha até outro nome, estafilococcia, que pode matar. A taxa de óbito chega a 34% em um mês se a pessoa não fizer um tratamento adequado.

“Eu mesmo não tinha consciência de que era tão grave o que eu tinha passado”, conta Junior Cigano, que enfrentaria neste sábado o russo Alexander Volkov. “Depois que o médico sentou para me explicar que pensei: Deus me livre, poderia ter sido algo bem ruim.”

O lutador teve que passar por uma cirurgia para a colocação de um dreno, por onde o pus que estava em sua perna saiu. Ficou internado nove dias. “Minha perna está um pouco inchada ainda, tenho que manter os curativos e ficar limpando constantemente, mas me sinto muito melhor, consigo fazer minhas atividades do dia a dia.”

Cigano contou que não está liberado para treinar, mas que pode voltar a dançar – por isso, voltou a participar do quadro Dança dos Famosos no programa Domingão do Faustão, na TV Globo. “Estou ainda tomando medicação, dois antibióticos. Não tenho previsão de quando vou ser liberado para os treinos, mas a melhora tem sido bem boa e acredito que não vá demorar muito para eu voltar e marcar uma próxima luta.”

QUANDO AS ACADEMIAS SÃO UM RISCO?

As academias de ginástica podem ser um risco não só à saúde de um atleta, mas de todos nós que a frequentamos. “O principal motivo para isso é a falta de higiene adequada. Academias que não têm rotina de limpeza podem realmente trazer sérios problemas”, diz o infectologista Alexandre.

Os principais problemas são infecções de pele. Os equipamentos da academia podem estar contaminados principalmente com bactérias, mas também outros microrganismos como fungos e vírus.

Vários estudos internacionais e nacionais mostram esse tipo de problema. “Por exemplo, um estudo feito na Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro, que avaliou colchonetes de abdominal e selim de bicicleta, mostrou que o número de microrganismos passou de 1600 por centímetro quadrado, sendo que superior a 100 já é considerado uma carga de bactérias excessiva”, explica o médico.

Outros problemas de saúde estão relacionados aos germes: conjuntivite causada por vírus, infecções intestinais causadas por bactérias como salmonella, fungos como os que causam pé de atleta, ou transmissão de vírus como herpes.

Em relação especificamente às infecções de pele, um estudo americano do ano passado mostrou que um halter tem 362 vezes mais bactérias que um vaso sanitário. Por que o vaso sanitário é mais limpo? “Porque banheiros têm uma rotina de limpeza”, diz o infectologista.

O ideal é que os equipamentos, incluindo colchonetes, selim de bicicleta, halteres e bancos acolchoados, além de tatame e sacos de pancada, sejam desinfectados com álcool gel a cada hora ou a cada duas horas. Se a sua academia não faz isso, limpe você os equipamentos antes e depois do uso.

E se por acaso você encontrar uma ferida ou levar uma pancada na academia, não a negligencie. “Todos esses traumas devem ser avaliados e se houver três fatores: aumento do tamanho, com edema ou inchaço; aumento do calor, da temperatura local ou se houver vermelhidão”, diz Alexandre. “Procure atendimento médico para uma avaliação de uma possível infecção de parte mole e já começar o tratamento, que será feito com antibiótico.”