Pular para o conteúdo principal
Blog do Marcelo Alonso

Henry Cejudo teria chances de conquistar o "4º ouro"?

Mais do que uma das melhores edições de 2019, o UFC 238 pode ser considerado o "Gran Finale" de uma história de superação que, se fosse levada aos cinemas, teria todos os ingredientes para se transformar em blockbuster. E o que faz da vida Henry Cejudo um roteiro perfeito para as telonas não é só o fato de ser o único campeão olímpico e de duas divisões do UFC, mas principalmente as dificuldades e episódios de superação protagonizados por este filho de imigrantes mexicanos, que tem uma curiosa ligação com o Brasil em momentos de virada de sua vida.


Caçula de sete irmãos, Henry foi criado num bairro muito pobre de Los Angeles passando o diabo nas mãos do pai alcoólatra e presidiário e da violenta vizinhança. Sem muitas opções, Henry encontra seu caminho com a ajuda do irmão mais velho, Angel, que o leva para treinar Wrestling. Muito obstinado nos treinos, o garoto de 16 anos começa a se destacar em competições estaduais até ser convidado pela brasileira, radicada nos EUA, Patrícia Miranda para ser seu sparring oficial nos treinos da seleção americana.
 
O talento e comprometimento do garoto chamaram a atenção da direção do centro olímpico e Henry acabou sendo convidado a fazer parte do programa de renovação da equipe americana para o próximo ciclo olímpico. Morando no CT, se alimentando como atleta e treinando diariamente com a equipe nacional, Cejudo se desenvolve rapidamente. Coincidentemente, o primeiro ouro internacional aconteceria exatamente no Brasil, no Pan Americano de 2007, no Rio. No ano seguinte, 2008, seria a vez do descendente de mexicanos conquistar o ouro em Pequim, se consagrando, aos 21 anos, como o mais jovem campeão olímpico de Wrestling da história dos EUA.

UFC 238: Cejudo, o 7º campeão em duas divisões | Cejudo é o novo campeão dos galos | Valentina nocauteia Jessica Eye | Ferguson vence Cerrone | Suarez e Sterling brilham no card preliminar | Todos os resultados
 
Em 2012, influenciado pelo primeiro treinador e amigo, Eric Albarracin, que havia passado uma temporada ensinando Wrestling na Team Nogueira, no Rio, Henry decidiu começar do zero uma nova história de superação, agora no MMA. E em apenas três anos conquistou 10 vitórias consecutivas, que o levaram a enfrentar o Nº 1 do mundo, o campeão do UFC Demetrius Johnson. Depois de ser nocauteado no 1º round, Cejudo mais uma vez teve seu destino reescrito no Brasil. Com a ajuda de Albarracin, passou a treinar em Natal com os irmãos Patrício e Patrick Pitbull, que adicionaram novas armas a seu arsenal. Com o Karatê aprendido no Brasil, Cejudo mudou inteiramente seu jogo e conseguiu duas vitórias que o levaram a revanche com seu algoz, em 2018, dois anos mais tarde. Depois de 5 rounds de guerra, Henry conseguiu a vitória na decisão dos juízes, destronando o maior peso-mosca da história (único homem a bater o recorde de defesas de cinturão de Anderson Silva).   


Se terminasse aqui a história, já teria ingredientes para ser transformada num grande clássico do cinema nas mãos de qualquer roteirista mediano, mas Cejudo queria mais.  E em janeiro de 2019 defendeu seu cinturão nocauteando o campeão dos galos TJ Dillashaw (que desceu para enfrenta-lo) em 32 segundos. Cinco meses depois, no UFC 238 no último sábado, Henry decidiu se arriscar tentando conquistar o cinturão vago deixado por Dillashaw (flagrado no doping). Mais uma vez o destino colocaria o Brasil em seu caminho, mas desta vez no outro lado do octógono.
 
Natural de Nova Friburgo, o especialista em Muay Thai Marlon Moraes chegava na disputa como favorito após uma impressionante sequência de quatro vitórias. Além da vantagem física natural do brasileiro, na terça-feira, Cejudo torce o tornozelo num treino e a informação da contusão vaza para a imprensa, o que, obviamente, aumenta muito a preocupação da equipe, afinal o brasileiro tinha os low kicks como uma das principais armas. Além de a falta de base prejudicar sua principal arma (as quedas), entrar com um alvo no tornozelo contra o principal striker da divisão de cima poderia ser um suicídio. Mas Cejudo decide arriscar e começa pagando caro por isso. Como esperado, Marlon aplica muitos chutes na perna o obrigando a mudar de base para preservar a contusão. Mas no segundo round a bagagem de competição, o histórico de adversidades e o coração do atleta olímpico começaram a fazer a diferença. A agressividade excessiva do brasileiro no primeiro round começa a cobrar um preço claro no seu condicionamento, e Cejudo começa a levar vantagem em pé, chegando próximo de nocautear o brasileiro com joelhadas no clinch. Até que, no terceiro round, Henry consegue definir a fatura com socos na guarda, obrigando o arbitro Marc Godard a interromper o combate, decretando o nocaute técnico. Mais uma vez Cejudo fazia história, passando a ser o quarto duplo campeão da história do UFC. Único a ter conquistado uma medalha de ouro olímpica.
 
Após a vitória, Cejudo aproveitou a oportunidade para, em entrevista no octógono, pedir aumento de salário ao patrão, se colocando à disposição para desafios ainda maiores, sugerindo inclusive que seu próximo passo pode ser a disputa do “quarto ouro”, desafiando Max Holloway (ou Frankie Edgar) pelo cinturão dos penas.


Em entrevista a imprensa, logo após o evento, Dana White reconheceu que a atuação heroica de Cejudo, mais uma vez, garantiu a continuidade da ameaçada divisão dos moscas e prometeu estudar com carinho as demandas do atleta. Depois de todas as barreiras que quebrou até aqui, é prudente não duvidar de Cejudo, mas dada a vantagem física de Max Holloway (campeão dos penas), 18 centímetros de altura e 13 cm de envergadura, este combate, pelo menos no papel, tende a não ser competitivo.
 
O fato é que, depois de tantos exemplos de superação, fica até difícil não acreditar na estrela de um lutador que transpôs tantas barreiras na vida e alcançou todos os objetivos que se propôs. Mesmo que não consiga conquistar seu terceiro cinturão do UFC, não duvidaria que se um roteirista minimamente competente decidisse levar a vida de Cejudo a Hollywood, em breve veríamos esta lenda do esporte comemorando seu quarto ouro. Desta vez na cerimônia do Oscar.