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“Meu primeiro UFC com Spider”, por Daniel Zukerman

Virou uma série: Anderson Silva volta a lutar no Rio em maio e faz famosos relembrarem a primeira vez que o viram em ação ao vivo. O primeiro é o repórter e humorista paulistano, que desenvolveu uma relação de amizade com o atleta

O UFC 237, que acontece no próximo dia 11 de maio, marca a décima vez em que os atletas da organização lutam no Rio de Janeiro. Essa história começou em 27 de agosto de 2011, quando o UFC resolveu voltar para terras brasileiras após um hiato de 13 anos. Anderson Silva foi o grande astro desse retorno – os ingressos para os 14 mil lugares da então HSBC Arena (hoje rebatizada de Jeunesse) esgotaram-se em poucas horas. Passados oito anos, Spider é, novamente, um dos protagonistas da edição de número 237.

Nostálgica que sou, relembrei aqui minha primeira vez em um evento ao vivo e como conheci Anderson. E resolvi então perguntar para outras pessoas que estavam nesse primeiro evento no Rio suas memórias daquela noite. A primeira pessoa que chamei foi o amigo Daniel Zukerman, repórter, radialista, humorista e empresário. Veja seu depoimento:

“Mais do que contar sobre minhas lembranças do UFC Rio 1, quero contar sobre minha relação com o Anderson Silva. Conheci o Anderson meses antes do UFC Rio 1. No começo de 2011, como estratégia para ajudar a popularizar o esporte por aqui, o UFC me chamou para ir para Las Vegas gravar uma matéria com ele. Eu trabalhava no Pânico na TV e fui uma semana antes da luta contra o Vitor Belfort [o UFC 126 aconteceu em 6 de fevereiro daquele ano], que era o franco favorito – até pelo fato de o Anderson não falar inglês muito bem na época, ele não fazia ainda o sucesso que alcançou mais tarde. Ele já estava num outro patamar depois da luta contra o Chael Sonnen, em que conseguiu dar aquele triângulo praticamente com a costela quebrada [no UFC 117, em agosto de 2010], mas não estava nem perto de ser o que virou mais tarde.

Por algum motivo, quando fiz essa primeira entrevista, Anderson foi com a minha cara e acabamos virando amigos. Então eu vivia o dia a dia dele na chamada fight week, que é a semana da luta. Ficava na concentração, ia no quarto do hotel, fazia entrevistas exclusivas. Nesse tempo, percebi que ele gostava de se divertir com os amigos. Ele ia jogar paintball horas antes de lutar. Era muita pressão que esse cara sofria. Para você ter uma ideia, um dia antes de ele enfrentar pela segunda vez o Chael Sonnen [no UFC 148, em julho de 2012], eu fui com ele no cinema assistir a um filme do Homem-Aranha. Imagina: o cara no auge da carreira dele e eu comendo pipoca com o cidadão no cinema. Era esse nosso nível de amizade.

Nesse tempo todo, fiz várias matérias com o Anderson, mas duas que considero especiais. Em uma delas, antes do red carpet do Oscar de 2014, inventei que a gente tinha feito um filme juntos. Fizemos até um trailler. No dia da cerimônia, falei pras pessoas, gente da CNN, de emissoras do mundo todo, que estava ‘lançando um filme com o Anderson Silva’. Todo mundo conhecia ele. O nome do Anderson abria portas. Um monte de gente me entrevistou acreditando que era verdade [o link da matéria está aqui].

Outra matéria muito legal foi quando ele tinha acabado de perder a segunda luta pro Chris Weidman [no UFC 168, em dezembro de 2013] e estava se recuperando da fratura na perna. Ele me recebeu na casa dele em Los Angeles para uma entrevista exclusiva em que me contou um monte de coisa legal. Tipo quando estava indo a uma festa à fantasia, vestido de Jack Sparrow, e foi parado numa blitz. Quando ele tirou o chapéu de pirata, o policial o reconheceu e até pediu desculpa. No meio dessa entrevista, em que ele estava bem chateado com o que tinha acontecido, falando muito sério, o que eu fiz para distrair? Combinei com a filha dele que telefonasse e dissesse que precisava falar uma coisa muito séria com ele. A ideia era que parecesse que ela estava grávida. Então o Anderson atendeu o telefone e me pediu desculpas, disse que tinha que sair muito rápido para encontrar com a filha. Só que nós saímos primeiro e fomos para a academia onde a filha estava. Montamos uma câmera escondida no estacionamento e fizemos uma simulação de uma briga de trânsito. Combinamos com um ator de quebrar com um taco de beisebol o retrovisor do carro do Hebert, que era empresário dele, e começa um puta pau lá. E o Anderson, que estava mancando, tentando apaziguar o negócio. Quando a gente revela o que aconteceu, ele mostra que estava com o coração acelerado e começa a rir. Era um jeito de humanizar aquele cara. Ele estava com tanta adrenalina e pressão nas costas que adorou descontrair [a matéria está aqui].

Acompanhei o Anderson, por nossa proximidade, quando acabavam todas as lutas às festas que o UFC organiza. Estava com ele tanto nas que ganhou como nas que perdeu. Em todas as festas das lutas que ele tinha ganhado, ele ficava muito sério, isolado, num canto. Eu via que não estava bem, não sentia ele aliviado por mais uma vitória. A única vez que vi o Anderson bem em uma dessas festas foi quando ele perdeu. Para mim estava muito claro: ele tirou um peso das costas. Anderson é uma referência. Mudou os paradigmas da luta. Eu acho que, no MMA, ele tem um peso de um Pelé para o futebol e um Ayrton Senna para a Fórmula 1. Ele que mudou o patamar do MMA para os brasileiros. Acho que naquele dia ele pensou: ‘Ufa, posso tomar um banho hoje sendo um ser humano, e não o melhor atleta do mundo, não um super-homem’.

Indiscutivelmente, Anderson ama o que faz. Tem uma determinação e um puta bom coração esse cara. Ele ajuda as pessoas que andam ao lado dele. Assisti à última luta dele pela TV e fiquei surpreso com o preparo físico. E devo ir para o UFC Rio 10 em maio. Mas acho que ele já provou o que tinha pra provar. Por que ele ainda luta? Uma vez perguntei para meu avô, o Eliova Zukerman, que era um baita neurologista do Einstein, por que ele continuava trabalhando com mais de 80 anos, se já tinha dinheiro e conquistas. Ele me falou que era porque era aquilo que amava fazer. O Anderson ainda luta porque ele ama lutar. E deve continuar até o tempo que achar que deve fazer isso. É o que ele gosta de verdade.

Eu estava na primeira vez em que Anderson lutou no Rio pelo UFC. Fui com a Sabrina Sato fazer uma entrevista para o Pânico. E me lembro que ele estava superleve. Puta evento gigante e o cara lá, brincando com a gente. E a luta com o Yushin Okami parecia um game, né? Ele fez o que quis. Não acho que o Anderson de hoje está fora do jogo. Ele tem técnica, tem preparo físico – só que não tem 20 anos mais. Mas tem uma coisa que eu acho mais importante de tudo: ele deixou um legado. E isso é dele pra sempre.”