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Blog do Marcelo Alonso

Whittaker x Adesanya: o xadrez do controle da distância

Por mais otimista que fosse em relação a popularização mundial do MMA, dificilmente um fã do UFC, nos anos 90, poderia sonhar com a possibilidade de assistir a uma disputa de título entre um representante africano e um australiano num estádio de futebol na Oceania em 2019.

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Pois este é o prato principal do UFC 243 que colocará frente a frente dois dos melhores strikers do MMA na atualidade: o nigeriano Israel Adesanya (campeão interino), naturalizado neozelandês, e Robert Whittaker (campeão linear), nascido na Nova Zelândia e naturalizado australiano. Obviamente os fãs devem lotar o Marvel Stadium, situado em Melbourne, para assistir a este confronto de estilos, que tem tudo para ser um dos mais interessantes do ano.

Momentos e estilos distintos

Depois de um início mediano entre os meio-médios (venceu três lutas e perdeu duas), Whittaker decidiu subir para o peso-médio em 2014. Desde então, nunca mais sentiu o gosto amargo da derrota, enfileirando nomes como Uriah Hall, Rafael Sapo e Derek Brunson, até chegar à elite da divisão. E se havia alguma desconfiança sobre o potencial do australiano, o nocaute técnico sobre Ronaldo Jacaré no 2º round em abril de 2017 a aniquilou. O cinturão veio na seqüência numa disputa épica de cinco rounds contra Yoel Romero no UFC 213, que acabou sendo repetida 11 meses mais tarde no UFC 225.

Obviamente estes 50 minutos de guerra contra o mutante cubano, cobraram um preço ao corpo do campeão, que se viu obrigado a fazer uma bela lanternagem, estando há mais de um ano fora do Octógono.

Contratado pelo UFC em 2018 graças a suas credenciais no mundo do kickboxing (foi campeão do GP do Glory), Israel Adesanya não decepcionou conquistando o cinturão interino do maior evento de MMA do mundo após vencer seis oponentes em apenas 14 meses na organização. Entre as vítimas, seu ídolo no esporte, Anderson Silva e Kelvin Gastelum, cuja vitória, numa das melhores lutas do ano, lhe garantiu o título interino e o direito de enfrentar Whittaker nesta luta principal do UFC 243.  

Curiosamente, apesar de serem strikers, Adesanya e Whittaker tem estilos absolutamente distintos e, como vimos acima, vivem momentos diferentes. Enquanto Adesanya vem de uma seqüência de seis lutas no UFC em pouco mais de uma ano,  Whittaker só fez uma luta neste período e volta de um período de 15 meses de inatividade e duas cirurgias.

Mas, segundo o próprio “Bobby Knuckles”, este longo período longe do Octógono não lhe afetará em nada. Muito pelo contrário, Whitaker garante que usou este tempo para recuperar o corpo de algumas contusões e que está voltando na melhor forma de sua vida.

Partindo do princípio de que ambos estão, de fato, em suas melhores condições físicas, vamos ao ponto que mais interessa neste combate: o confronto de estilos.

Apesar de terem a predileção pela luta em pé, Israel e Robert são strikers com características absolutamentes distintas.

De um lado, um carateca com boxe refinado, que tem um queixo duríssimo e ataca de maneira incessante, alternando combinações duras na curta distância com um bom wrestling.

Do outro um kickboxer com mais de 2,03m de envergadura, que combina os golpes retos e movimentação de pernas para não permitir que o oponente consiga alcançá-lo ou levá-lo para o solo, com uma precisão cirúrgica, que lhe garante desperdício mínimo de golpes e, consequentemente, uma bela reserva energética em lutas longas.

Brasil

Se por um lado Adesanya terá 16 cm de vantagem na envergadura (1,87m x 2,03m) facilitando seu controle das ações da média para a longa distância, por outro, Whittaker é mais veloz e costuma imprimir um ritmo alucinante, trabalhando as fintas para encurtar e atacar com seqüências perigosíssimas.

Como vem de três lutas contra os mais temidos grapplers da divisão (Ronaldo Jacaré e Yoel Romero), o australiano deve estar com o wrestling bem afiado, o que certamente pode ser um fator de desequilíbrio nesta luta, uma vez que o faixa-preta de jiu-jítsu teria clara superioridade técnica sobre o nigeriano (faixa-azul de André Galvão) no solo.

Mas vale lembrar que nenhum dos seus seis oponentes no UFC conseguiu colocá-lo para baixo por muito tempo, e Whittaker não costuma desperdiçar energia fazendo força em excesso em lutas de cinco rounds. Ou seja, é bem provável que o combate transcorra em pé.           

Analisando o penúltimo combate do nigeriano contra Anderson Silva, chama atenção sua capacidade técnica de agredir o adversário, mesmo recuando. Já em sua última luta, com Kelvin Gastelum, vale ressaltar a maestria com que usa as fintas e se antecipa aos ataques do oponente, usando golpes retos e chutes para mantê-lo na sua distância de segurança.

Dois outros aspectos na luta com Gastelum também devem ser observados, porém, de maneira positiva para Whittaker. A capacidade de absorção de golpes do nigeriano não é das mais impressionantes e a maneira com que ele foi surpreendido pela velocidade do norte-americano em duas oportunidades. Se teve problemas com Gastelum, contra um lutador mais técnico na luta em pé, mais veloz e com um volume muito superior de golpes, como Whitaker, as chances de ser surpreendido são bem maiores. Afinal de contas, controlar a distância sem cometer erros por 25 minutos contra uma máquina de atacar como Whitaker, definitivamente não é tarefa fácil.

Já o campeão linear precisa fazer uma estratégia totalmente distinta da sua última luta contra Yoel Romero, quando basicamente esperou o cubano tomar iniciativa para contragolpear encaixando seus melhores golpes.

Contra Adesanya, Whittaker terá que tomar a iniciativa do combate cortando ângulos para evitar ao máximo os jabs de Adesanya, que foram fundamentais na vitória por pontos sobre Gastelum e Anderson Silva.

Uma boa maneira de não deixar Israel impor seu kickboxing no MMA é encurtar com seqüências longas sempre buscando minar a linha de cintura do nigeriano com seu fortíssimo gancho de esquerda. Se ganhar o centro do Octógono e conseguir encurralar Adesanya nas grades alternando seqüências de chutes e socos com entradas de queda, Whittaker obrigará o nigeriano a se manter sempre preocupado diante da possibilidade de cair por baixo, o que certamente afetará seu plano tático.    

A única certeza é que este xadrez da distância deverá ser disputado golpe a golpe, cobrando um preço na fisionomia dos dois lutadores após a luta. Não é a toa que as bolsas de apostas estão divididas. Há sites de apostas dando vantagens mínimas para ambos.

Analisando os dois estilos no papel, a minha aposta é numa vitória por pontos de Whittaker ou nocaute técnico a partir do 4º round, mas não me surpreenderia se Adesanya conseguisse controlar a distância durante a maior parte da luta, roubando o cinturão linear de “Bobby Knuckles” dentro de sua casa.

Aliás, para o fã brasileiro, este seria um excelente resultado, afinal de contas Paulo Borrachinha estará nas primeiras fileiras aguardando o vencedor para desafiá-lo. E obviamente uma luta entre o brasileiro e o nigeriano, que se odeiam, teria muito mais potencial de vendas.

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