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Entrevistas

Do gramado para o Octógono

“Descoberta” em um jogo de futebol por um professor de jiu-jítsu, Viviane Araujo conheceu a luta só aos 18 anos – e viu que tinha nascido para isso

Aos 18 anos, Viviane Araujo era uma feliz jogadora de futebol do Cresspom, clube do Distrito Federal, quando, depois de uma partida, recebeu um convite inusitado de um torcedor. “Ele me disse que eu era muito explosiva e, pelo meu perfil, devia ser lutadora, e não jogar bola”, ela relembra, rindo, direto de Edmonton, capital de Alberta, no Canadá.

Brasil

O tal torcedor era um professor de jiu-jítsu, que a chamou para uma aula-teste. O lado competitivo de Vivi, com o qual ela estava acostumada desde criança, aflorou e ela ficou intrigada. “Fui fazer meu primeiro treino e amei.” Embora tivesse já 18 anos, idade avançada para quem vai começar a treinar em alto nível, Vivi não se abalou. “Me amarrei e pensei: quero competir. Com seis meses de treino, fui campeã brasileira, ainda na faixa branca. Na hora já falei: ‘Cara, não quero mais saber de futebol, meu negócio agora é só jiu-jítsu’.”

Vivi dedicou-se de verdade ao esporte. Passou a ir todos os dias à academia, foi campeã na faixa azul e roxa de diversos torneios. Na faixa marrom, fez seletiva para o mundial de Abu Dhabi de 2014, venceu na categoria até 66 quilos e foi disputar o campeonato nos Emirados Árabes – onde parou nas quartas de finais.

Quando voltou de lá, recebeu outro convite. Desta vez, um professor de muay thai a chamava para treinar a luta. “Eu não sabia nada de trocação, nunca tinha pensado em fazer isso.” Mas, aberta às oportunidades, começou a treinar com Rodrigo Aguiar na Companhia Athletica de Brasília.

“Logo eu senti que tinha talento para a trocação. E comecei a competir também”, Vivi ri de novo. “Quando ganhei a primeira luta pensei: acho que é isso também.” Foi só então que Vivi passou a considerar as artes marciais mistas. “Procurei uma academia em Brasília e achei a Cerrado MMA, onde estou até hoje.”

Claro que a Vivi competitiva veio à tona também nesse esporte. A atleta já se candidatou a uma luta profissional um ano depois de seus primeiros treinos, em Brasília, e venceu na estreia. Menos de um mês mais tarde, fez uma nova luta. Venceu novamente. Aceitou lutar no Jungle Fight em 2016. Nova vitória. “Foi só então que eu achei que podia dar certo essa história de MMA. Procurei então me profissionalizar mais, treinar mais.”

Depois de sua sétima luta, disputada no Japão em agosto do ano passado e da qual não saiu apenas com a vitória, mas com vários fãs japoneses, Vivi finalmente pensou que o UFC passava a ser um sonho possível. “Em fevereiro deste ano, recebi a notícia de que estava cotada para o Contender Series. Meus treinadores me falaram para eu dar duro nos treinos, que a oportunidade podia chegar a qualquer momento. Isso virou minha meta.”

No começo da semana do UFC 237, que aconteceu no Rio de Janeiro em 11 de maio último, Vivi estranhou as dezenas de mensagens que apareceram em seu celular ao mesmo tempo. “Pensei: meu Deus do céu, o que está acontecendo? Abri o telefone e vi que eu estava no UFC e já teria que lutar no sábado.”

Quem pensa que a atleta refugou se engana. “Aceitei na hora! O cavalo branco passou não hesitei: peguei ele”, ela brinca. “Isso foi na quarta de manhã. Corri atrás de todos os exames, consegui fazer tudo e no fim da tarde estava embarcando para o Rio para a Semana da Luta. O processo todo foi muito louco. Estava preparadíssima, porque não deixei de treinar. Meu camp estava rolando fazia muito tempo.”

O susto que Vivi tomou ao ser chamada de supetão foi o mesmo que ela deu em todo mundo ao vencer, duas categorias acima da sua de origem, a brasileira Talita Bernardo – Vivi sempre lutou no peso-palha, até 52 quilos, mas aceitou e derrotou a atleta do peso-galo, até 61 quilos.

Agora a lutadora está no Canadá para fazer sua segunda luta pelo UFC, contra Alexis Davis, sétima no ranking das pesos-moscas, até 56,7 quilos. “Foi uma decisão minha e dos meus treinadores subir para o mosca”, explica. “É por questão mais de saúde mesmo. Me senti muito bem lutando no peso-galo, mas as atletas são muito grandes e eu sou pequenininha”, conta, sobre seu 1,65m. “Tenho que subir muito de peso e perco minha maior característica, que é a velocidade.”

No peso-mosca, ela acredita que pode manter outras de suas competências. “Sou muito agressiva e explosiva, não dou brecha para a adversária e boto muita pressão”, afirma. Como outro de seus diferenciais, Viviane aponta a força mental. Ela trabalha com uma psicóloga do esporte há três anos – e não abre mão.

“A cada luta, vejo diferença enorme no meu foco, no desempenho e em como mantenho a estratégia traçada mesmo quando o combate não corre como o esperado”, diz. “Faço um trabalho de mentalização da luta uma vez por dia, durante várias semanas. Como mentalizo muitas vezes, inclusive me colocando em situações ruins, se isso acontecer na luta eu já passei por aquilo, não é uma novidade.”

Viviane Araujo – que, sim, é constantemente associada à atriz e sambista, mas brinca dizendo que não vai entrar na arena com uma música do Belo e conta que nem sambar sabe – diz que luta pela família. “Vim de uma família bem humilde e vejo na luta uma forma de dar uma vida melhor para minha mãe e meus irmãos.”

A mãe, aliás, adora o que ela faz. “No começo ela não gostava muito da ideia de eu lutar, mas hoje é minha fã número 1”, revela Vivi. “Ela não gosta de ver meu combate ao vivo, mas assiste a todos depois, quando sabe que estou bem. Nas redes sociais é até engraçado: ela fica me tietando.”

Depois de muito mentalizar, como sempre faz, Vivi crava o resultado de sua luta contra Alexis Davis: “Visualizei muito e vou vencer no segundo round por finalização.”

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